28 abril 2006

Como se recomeçar

fosse voltar ao princípio e não é. Como se a escrita fosse tangível daqui e eu debruçada a vê-la cair sem poder fazer nada ou mexer-me. Eu entre a inércia e o espanto a medir o abismo que de há uns anos para cá me separou das palavras
para sempre
entre o tédio e o pranto a ajuizar a distância da pele à metáfora e é grande, é imensa, é brutal e estou tão cansada. Eu a ser empurrada e a reparar que é por isso, é só por isso, que me mantenho em andamento embora não saiba lá muito bem para onde vou nem porquê e uma pilha de livros à espera que os meus dedos se excedam e escrevam, enfim, o que lhes peço. Mas nunca escrevem, nunca se excedem, há anos que os tenho parados nas mãos, já quase não fazem parte de nada, os meus dedos, e às vezes ficam dormentes. Como se recomeçar fosse, de alguma forma, o sol de vermelho no limbo, o horizonte e a luz e o mundo contagiados de sangue e não é, nunca foi. Não é suposto doer e parece que é disso que não me convenço, não é suposto doer. Não é o sangue que vejo nascer todos os dias da minha janela, pois não.

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