11 abril 2007

A sorte

é poder abrir a janela, debruçar-me e saber que não dá para o mundo, que lá em baixo na rua não passam olhos a ver-me e que ninguém me espia pela calada da noite, tentando roubar-me o sentido ou apropriar-se de certas palavras que, vendo bem, nem sequer me pertencem.
A sorte é a certeza de que me abro de par em par sem pudor, deixando entrever não só o meu corpo, mas um pouco da alma de que sou feita, a sorte de me encostar ao parapeito sem que a vertigem da queda me assuste, sem ter de acenar nem sorrir às vizinhas que dividem o plasma comigo, sobretudo, sem ter de lhes ouvir os palpites ou de engolir as maldades que cospem à porta umas das outras.

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