06 julho 2005

Olá, eu sou a Marta!

- Olá Marta! Por favor, dê uma voltinha... Isso mesmo! Muito bem! Marta, que idade tem?
- 32.
- Trinta e dois?
- 32.
- 32 ou trinta e dois?
- Eu disse 32.
- Muito bem, 32. Casada?
- Solteira.
- Profissão?
- Recepcionista.
- Numa multinacional?
- No escritório do meu tio.
- Ah! Empresa familiar?
- Sim.
- Qual é o ramo?
- Confecções.
- Muito bem. Ipê, tem?
- I quê?
- IPÊ.
- Ipê?
- IPÊ.
- Não. Mas tenho telemóvel.
- Pois, mas isso não nos serve para nada!
- Alergias?
- Singelas!
- Diga?
- Simples. Ao pó, aos cochichos, aos acarónimos...
- Muito bem. Pinta o cabelo?
- Não.
- Olhe que devia.
- Acha mesmo?
- Hum... Deixe cá ver... bom, talvez ainda aguente mais uns meses. Tem doenças?
- Esquizofrenia.
- O quê?, também?!
- Também!
- Ouve vozes?
- E suspiros.
- E isso dura há quanto tempo?
- Há meia hora, mais ou menos.
- Muito bem. Quarto número cento e dez, a chave é esta... É já ali, ao fundo do corredor.
- Ao lado do da Sophia?
- Isso mesmo, o dela é o cento e onze. Marta, boa sorte e bem vinda ao manicómio.
- Isto é para a televisão, não é?
- É, é. Agora vá.

2 comentários:

Anónimo disse...

sem complacência nem piedade, a prosa merece duros reparos, porque podia voar e não voa, porque podia ser música mas não é:

lentos arrepios de ausência
tua voz profunda e doce
O vento (...)segreda-me o outono que há-de vir

tudo lugares comuns, a empobrecer um texto onde se esperava
que a demência semeasse imagens mais poderosas, mais perturbantes... De terror? Talvez...

'Chamo aos gritos por ti - não me respondes
Bejo-te as mãos e o rosto - sinto frio.
Ou és outra, ou me enganas, ou te escondes
Por detrás do terror deste vazio...'

Bela imagem, não? 'Ou és outra, ou me enganas...' Palavras dementes
de tanto espanto, de tanta dor, dementes perante o que é impossível de aceitar! Mas já perdi tempo demais contigo, filha, não sei porquê, talvez mereças. Receito-te: duas páginas de Herberto Helder antes do deitar; meio canto da Odisseia ao acordar. Boas leituras.

Dr. Singelo

Anónimo disse...

Marta,
Tive um furo. Ai, espera, enganei-me, não é aqui. Desculpem.